As Bike Anjas surgiram da necessidade de trazer a participação das mulheres para a agenda da mobilidade e para as ruas. Com a intenção de fortalecer e unir mulheres que querem pedalar nas ruas das cidades brasileiras, o coletivo quer também fortalecer as mulheres que encontram barreiras na sua vida cotidiana, mas principalmente no quesito locomoção . Mas precisa disso?
Precisa. Explicamos!
Enquanto homens transitam livremente pelos mais diversos espaços (muitas vezes, “de poder”), nós ainda somos questionadas sobre nossa participação (e intenção) a cada passo, a cada pedalada. Para diminuir a violência simbólica que sofremos diariamente, seja na exclusão ao falar em eventos públicos, seja na hora que vamos pedalar e opinam – muitas vezes sem serem solicitados e como detentores do saber – sobre a altura do nosso banco, escrevemos esse manifesto com algumas dicas sobre esse assunto que nos rodeia cada vez mais.
Para começar a explicar a gravidade de alguns episódios, precisamos compartilhar alguns fatos que fazem muita diferença no contexto. Ouvimos e repetimos que mulher não entende nada de mecânica – seja de bike, carro ou liquidificador. Será que isso verdade? E se isso é de fato uma realidade, por que ela faz parte de nossas vidas?
Homens vieram com esse conhecimento de fábrica ou eles foram ensinados ao longo da vida? E se os homens aprenderam, porque nós não? Essa resposta é daquelas que nem precisa de ajuda das universitárias para responder: Nós, simplesmente, não tivemos a oportunidade de aprender determinadas coisas que, para os homens, foram ensinadas desde os primeiros passos. Afinal, vocês ganhavam carrinhos e nós bonecas, lembram? Quando crianças, não podíamos nos sujar, tínhamos de sentar de forma comportada, nos comportar feito mocinhas e ainda ajudar a mamãe com as tarefas de casa e cuidar dos irmãos.
DICAS ANJAS
UM GUIA BÁSICO, FEITO POR MULHERES, PARA AJUDAR OS HOMENS A ENTENDER ONDE ELES TÊM ERRADO.
Assim como ensinamos a pedalar por nos considerarmos ciclistas experientes, sentimos que as mulheres têm muita experiência no quesito “ser mulher”. Por isso, acreditamos que nada melhor do que nós para falar sobre como nos sentimos e ajudar os homens a entenderem algumas situações pelas quais e passamos diariamente.
Abaixo, preparamos uma FAQ, do inglês Frequently Asked Questions (Perguntas Frequentes, em português) para facilitar a compreensão do porquê tanto nos incomodamos com algumas situações:
Grupo de mulheres dentro da Rede do Bike Anjo que oferece suporte interno às demais voluntárias mulheres e, além disso, exerce o papel de empoderamento de outras mulheres que querem pedalar.
Já notou que, quando uma mulher está falando, muitas vezes ela é interrompida? E que em grande parte dessas vezes quem faz isso é um homem? Temos um termo para isso: “manterrupting”, que faz uma piada com uma interrupção causada por um homem (man). Isso não é por acaso e é SIM uma forma de machismo! Atente-se para não ser esse cara, cara!
Conheça outros termos semelhantes e seus significados e observe os comportamentos de homens (e o seu!) em relação às mulheres:
- Manterrupting (A palavra é uma junção de man (homem) e interrupting (e interrupção) Em tradução livre, manterrupting significa “homens que interrompem”) – a prática sexista de interromper uma mulher quando ela está falando. Fonte com exemplos: Nexo
- Bropriating (O termo é uma junção de bro (curto para brother, irmão, mano) e appropriating(apropriação)) – o termo refere-se a quando um homem se apropria da ideia de uma mulher e leva o crédito por ela em reuniões. Pode parecer surreal, mas isso acontece com muito mais frequência do que imaginam!
- Mansplaining (O termo é uma junção de man (homem) e explaining (explicar). É quando um homem dedica seu tempo para explicar a uma mulher como o mundo é redondo, o céu é azul e 2+2=4) – Diariamente, somos pegas por essa situação: um homem, depois de nos interromper e se apropriar do que estávamos querendo dizer, tenta nos EXPLICAR algo que nós já sabemos! Sim! Nós sabemos muita coisa, sabiam?
- Gaslighting (a origem do termo é ligada a peça teatral Gas Light (1938) e às suas adaptações para o cinema (1940 e 1944), em função da manipulação psicológica sistemática utilizada pelo personagem principal contra uma vítima. Hoje é utilizado também na literatura clínica) É uma das mais comuns violências (não físicas) que sofremos! É uma emocional por meio de manipulação psicológica, que leva a mulher e todos ao seu redor acharem que ela enlouqueceu ou que é incapaz. Parece exagero, né? Mas é assim que vocês se colocam quando algo não sai como o esperado por vocês. Marque um ponto para cada vez que as frases a seguir já foram ditas por você (em qualquer situação: em casa, no trabalho, entre amigos…):
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- “Você está exagerando”
- “Nossa, você é sensível demais”
- “Para de surtar”
- “Você está delirando”
- “Cadê seu senso de humor?”
- “Não aceita nem uma brincadeira?” / “Tá bravinha, hein?”
- E o mais clássico: “você está louca”.
- Está de TPM?
Deixa eu adivinhar!
Você totalizou 8 pontos?!
Em suma, esse tópico tem UM apelo: deixe que a mulher fale! Permita que ela conclua o que começou a falar, deixe que ela apresente suas ideias e projetos, deixe que ela compartilhe suas experiências, desejos, dores. OUÇA o que ela está falando, e, muitas vezes, ensinando! Não explique coisas que elas já sabem e, por fim, não duvide e diminua uma mulher a adjetivos que te isentam de qualquer situação.
Como mencionamos acima, o machismo atinge muito mais níveis do que os olhos masculinos conseguem ver. E isso não é um superpoder nosso, mas sim um privilégio dos homens. Está na dúvida sobre uma situação ter sido machista? Faça o seguinte exercício: substitua a mulher da situação por um homem. Você teria a mesma reação/atitude? Tente novamente!
Pode.
Não queremos negar o espaço de discussão entre homens e mulheres e sim priorizar que mulheres da rede Bike Anjo tenham a possibilidade de ocupar espaços que não são direcionados para mulheres, ou seja, que a rede Bike Anjo também pode ser um agente de mudança cultural voltada para confrontar o machismo nos espaços de discussão.
Estamos dispostas a ajudá-los com essa desconstrução/reconstrução diária. Se tem dúvidas sobre sua atitude, pense, questione, observe e se a dúvida ainda permanecer, pergunte para alguma Anja o que ela entende da situação.
As mulheres têm um padrão de deslocamento diferente dos homens e utilizam mais o transporte coletivo e a caminhada como forma de deslocamento. Leia mais a respeito aqui.
Em São Paulo o total de ciclistas mulheres nas ruas é irrisório comparado com os homens. Segundo dados do GT de Gênero da Ciclocidade de 2015, nas contagens realizadas apenas 6% do total de ciclistas eram mulheres. A pesquisa também mostra que a um dos maiores problemas enfrentados pelas mulheres é o medo de compartilhar a via. Esse dado evidencia a importância do grupo de apoio e das dicas que as Bike Anjas compartilham.
Como falamos anteriormente, as mulheres têm muita experiência no quesito “ser mulher” e, em situações em que seja necessário falar SOBRE mulheres, se houver uma mulher que possa comparecer e falar sobre o assunto, é muito melhor, não é? É o espaço de fala DELA. Da mesma forma ao se referir a outros grupos específicos como LGBT, étnicos, etc. Só se fala em nome desses grupos caso não estejam presentes (e deve-se sempre procurar garantir suas presenças), caso contrário esse espaço de fala é del@s.
BIBLIOGRAFIA-ANJA
QUER APRENDER MAIS, HOMI? ENTÃO BORA!