Comunicação Bike Anjo
Em 1992 a Rede de Mulheres Afro-latino-americanas e Afro-caribenhas definiram o 25 de julho como Dia da Mulher Afro-latino-americana e Caribenha, Lei nº 12.987/2014, que foi sancionada como o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra.
Tereza de Benguela foi uma líder quilombola, viveu durante o século XVIII, e sob sua liderança, a comunidade negra e indígena resistiu à escravidão por duas décadas, um símbolo de luta e resistência, assim como tantas outras, que merecem visibilidade na nossa história.
A construção dessa data é importante para refletirmos sobre as desigualdade, em primeiro de gênero: Segundo o texto Acesso de Mulheres e Crianças à Cidade do ITDP (2018) “As mulheres têm menos acesso e controle a recursos financeiros ou enfrentam maiores dificuldades para usufruir das oportunidades oferecidas no meio urbano de forma igualitária e segura”. Quando pensamos sobre a forma como o trabalho é dividido em diferentes famílias, em geral as mulheres são comumente responsáveis pelo cuidado com a casa, filhos, parentes e até tarefas como compras e demais atividades cotidianas, e isso mesmo quando possuem também um trabalho externo. essa é a chamada divisão social do trabalho, que sobrecarrega mais mulheres do que homens, e que mesmo comparando o mesmo cargo empregatício em empresas, é comum que elas recebam menos por isso.
Quando falamos de mobilidade e acesso à cidade, toda essa divisão do trabalho e das tarefas se reflete em comportamentos diferentes na cidade. Enquanto as mulheres circulam em diferentes espaços de compras, cuidados com a saúde, trabalho e até instituições de ensino dos seus filhos, sobra menos tempo para realizar outras atividades culturais, esporte e lúdicas que os homens.
Mas não é apenas questão de gênero, outras questões atravessam o tema como raça e classe social. Ainda segundo o ITDP:
“o fatores que potencializam a vulnerabilidade, são as mulheres negras e pobres, moradoras de áreas periféricas menos servidas de infraestrutura urbana, com pouca diversidade de atividades e serviços, que estão em um grupo mais vulnerável. Seus interesses e necessidades para acessar as oportunidades da cidade de forma mais justa e segura são peculiares à sua vivência, pois estas mulheres precisam lidar com a exposição ao risco de forma diferente das mulheres que vivem, por exemplo, em áreas mais centrais, em bairros privilegiados mais bem servidos de infraestrutura urbana e com grande oferta de serviços e empregos.”
Essas são as consequências de um racismo estrutural, que potencializam situações de vulnerabilidade já sofridas por mulheres, mas que afetam sobretudo mulheres pretas, como aponta a diretora Geral da Ciclocidade, Jo Pereira durante o texto A Cor da Mobilidade:
“as consequências do racismo estrutural – como a hiperssexualização do corpo negro e a configuração excludente das grandes cidades brasileiras – se traduzem para pretos e pardos no Brasil em situações cotidianas de assédio e menor poder de decisão em relação ao planejamento do transporte público, entre diversos outros problemas”.
Ainda falta um grande caminho para a visibilidade não apenas dessa data mas de toda a luta que ela representa. Neste contexto, a fim de visibilizar as trajetórias e as contribuições das afro-latino-americanas e caribenhas, a Bike Anjo realizou na última quarta-feira 28/07 uma live no instagram com o tema do Dia da Mulher Afro-latino-americana e Caribenh com a participação de:
Ruth Costa, Paraense, natural de uma comunidade quilombola no município de Concórdia do Pará, Mulher negra, mãe, avó do Cadu, Agnes e da Olga, Feminista, cicloativista, Técnica em Segurança do Trabalho, atual Diretora administrativa da União dos Ciclistas do Brasil, voluntária da rede bike anjo Belém, integrante do coletivo Paráciclo e uma das fundadoras do projeto Pedala, mana! Atualmente trabalha pela mobilidade sustentável.
Glória França, Membro do Pedal das Minas, mulher não-branca, lésbica e maranhense. Professora Dra. na UFMA e Coordenadora do GEPEDIS (grupo de estudos e pesquisas em Discursos, Interseccionalidades e Subjetivações.).
Durante a live, as convidadas trouxeram um pouco da história de como se relacionam com a bicicleta e o papel fundamental da rede de mulheres que as cerca, trocando aprendizados não apenas sobre bike como também demais vivências como meio ambiente, ocupação das praças, cidadania, saúde, parto, e sobretudo, empatia. A empatia aparece como um elemento fundamental para acolher pessoas que possuem pontos de vista e vivências diferentes da sua e podem precisar de ajuda para subir na bike ou até acreditar que conseguem. As “encruzilhadas”, um termo trazido por Glória para explicar o conceito de interseccionalidade, ajudam a entendermos como muitas mulheres pretas e periféricas não possuem o mesmo acesso à cidade e a diferentes oportunidades de emprego, lazer, serviços… o que também não é diferente no universo da bicicleta.
Marcar pedais com horários que sejam acessíveis para quem precisa voltar pra casa mais cedo por conta da limitada oferta de transportes ou pela segurança são exemplos de empatia e acolhimento, ou ainda, marcar atividades próximas a residência dessas mulheres pode ser um grande incentivo.
Ruth também trouxe também experiências sobre a necessidade de acompanhar mulheres no ritmo delas,e se necessário descer da bike para deixá-las mais confortáveis, e não pressioná-las a acompanhar. Esse comportamento rendeu frutos e relatos de mulheres que conquistaram trajetos maiores com o tempo e graças a essa atenção do grupo são hoje responsáveis por acolher mais mulheres.
A rede Bike Anjo construiu coletivamente em 2020 um Manifesto Antirracista, que convoca um posicionamento de toda a sociedade frente as desigualdades raciais e suas encruzilhadas. Esperamos que essas sejam pequenas pedaladas na direção de um mundo mais igualitário, inclusivo e empático. Bora junto?
Conheça nosso Manifesto Antirracista
